sábado, 21 de agosto de 2010

CARTA RESPOSTA A RUI BARBOSA

Prezado Rui Barbosa
Li sua antiga e maravilhosa carta. Sinto-me também decepcionado e os anos que nos separaram não recuperaram a vergonha nacional. Somos professores e educamos do porteiro ao presidente da repúbllica. Médicos, engenheiros, psicólogos, religiosos, artistas e todas as outras listas. A maior parte desta gente me envergonha e custa-me acreditar que frequentaram escolas e que por suas venezianas não tenha passado uma fina fresta da luz da verdade e da honestidade.
Professores se formam e muitos deles não sabem escrever um texto que qualquer um escrevia antigamente, quando formado numa quarta série ginasial. A maior parte não tem o hábito da leitura. Não conhece nem os nossos escritores nacionais. Falar com eles de surrealismo, cubismo, poesia concreta ou quaisquer assuntos de nivel intelectual é o mesmo que proferir uma frase em chinês.
Médicos que a cada dia nos vêem menos. Só fazem deduções através de aparellhos, pois o ser humano está perdendo paulatinamente o dom da observação e da intuição. Somos um fígado, um estômago, uma garganta, um couro cabeludo e não somos mais um ser humano integral, meu prezado eleitor ouvido direito inflamado.
Perderam o fio, dispensaram a Ariadne , explodiram o labirinto e empregaram o minotauro em Hollwood. Engenheiros constroem casas de farinha, talvez porque foram criados em arranha-céus e não brincaram de fazer castelos de areia e barro. Haja visto que não são todos, prezado Rui, mas refiro-me a uma grande parte.
Os jovens saem do Ensino Médio sem dominar a escrita básica e a matemática elementar. Aprender verbos e tabuadas é totalmente proibido, se for à moda antiga. Existe um método moderno, que partiu de um raciocícino pragmático, mas por falta de inteligência pedagógica, foi levado ao exagero total de um construtivismo destruitivo. Desde Aristóteles que já sabemos do aprendizado obtido pelas correlacões lógicas e pela sequência intercomunicativa cerebral da repetição, porém, ignorado neste mundo moderno. Pouquíssimas unidades de ensino se dedicam também ao estudo da filosofia e da sociologia, talvez porque a magia filosófica da reflexão e da radiciação de idéias não tenha mais valor nos tempos atuais, onde os valores do ter, são superiores ao do ser.
É muito comum se ouvir: "detesto filosofia". Claro, ela nos provoca a pensar e para pensar são necessários neurônios sadios e numa sociedade dos conservantes, acidulantes, hamburgues, refrigerantes, alimentos hormonizados, poluição por toda parte, etc., não vai ser facil encontrar um cérebro que tenha força para pensar.
Alguém pode até nos acusar que somos formados à moda antiga e que somos da geração que substituiu a rígida palmatória pela flexivel sandália havaiana e que hoje as coisas estão mais no diálogo e por aí vai. Não discordo do valor transcendental do diálogo, mas estou falando de outras coisas.
Realmente tínhamos o lápis atrás das orelhas, mas possuíamos um conhecimento exemplar. A tabuada estava nas pontas dos dedos e também nas pontas das linguas.
Caro Rui, pessoas programadas pelo sistema não são livres. Onde está nosso ideal de liberdade, igualdade e fraternidade que o prezado irmão tanto defendeu?
Dizem que vivemos numa aldeia global, prefiro acreditar que nos encontramos num isolamento total, cada um vivendo em sua ilha e tribo separada. Classes escravizadas demonstram uma Pátria desigual. Tal arroz de terceira, terceirizaram quase todos os trabalhadores em nome da idéia liberal, que chamam de neo e que de nova não tem nada, pois foi fundamentada no século XVII, enquanto a idéia social surgiu no século XIX, com certeza impulsionada pelos horrores do liberalismo e da tal revolução industrial.
Todos estes profetas, patetas, políticos, paleolíticos e neolíticos pensadores do neo-liberalismo passaram pelos bancos escolares. Isto demonstra a falibilidade de nossa escola. Não prego uma escola doutrinadora, mas não aceito uma escola unilateral e porta-voz de um sistema opressor. Graças a Deus não pertenço a nenhum sistema assim, mas há muitos ainda pelo Brasil a fora.
Quem é o novo poeta brasileiro, o novo escritor e pensador que a juventude adota para ler e discutir? Então seria preciso procurar a juventude e será que vamos encontrar no meio dela alguém interessado neste tipo de assunto? Sim, uns poucos com certeza. Isto também é uma outra característica da falência de nosso sistema educacional.
O negócio hoje é surfar e deixar descer redondo. A voz da mídia é mais forte que a fala da educação e da família. Não se pode mudar o rótulo por causa do conteúdo e vice-versa. Então é mister e urgente uma mudança. Em que fonte deveríamos procurar o germem da mudança social?
Há coisas interessantes. Acredito Rui, que existe algum prefeito, vereador, deputado, governador, senador que ainda é do bem e queira me ouvir, prestar atenção. Ajudem a todos aqueles que possuam idéias emergentes, como por exemplo as cooperativas, as associações de bairros, os grêmios estudantis, as ongs, etc. São movimentos novos que avançam além das leis e dos métodos trabalhistas. São manifestações rurais e também urbanas, alternativas que estão a serviço de uma nova sociedade.
É assim que hoje damos o recado, Rui. É pela internet.
Também há grandes educadores com novos projetos. Deles não me envergonho, Rui. A palavra saber tem a mesma raiz latina de sapore que é sabor. Se não tiver um sabor agradavel não há como digerir. Não tem como engolir uma educação pós-moderna, burocratizada, estereotipada em nefastos projetos que estão aquém da realidade do aluno.
Você se lembra Rui, na sua época a educação nascia junto com o barro branco da batinga, com o metro, o alfabeto com a correnteza da vila. Não se formavam pedagogos em série, numa fábrica de linha de montagem. Sob a luz da vela e da lamparina nasceram os Machados de Assis, os Bandeiras, os Bilacs, os Drumonds, os intelectuais que não existem mais.
Será esta a república democrática que você sonhou? A maior preocupação educacional hoje em dia é medir com provões, com dados estatísticos, com índices a qualidade do ensino? Porém, de onde vem esta norma estatística? São mirabolices fellinianas estes dados que eles acreditam corresponder com a realidade social/educacional. Se estivessem realmente preocupados com a educação aumentariam a verba educacional. O caos da educação abre a cada dia mais o buraco negro da ordem social, onde é sugado desde a periferia e adjacências, até aos centros mais convulsivos, todo o equilíbro que deveria haver numa sociedade livre e democrática.
Prezado Rui, hoje se fala demais em inclusão. Mas o sistema econômico é cada vez mais desigual e excludente. Em nosso País vivemos o sonho desumano da corte de Luis XVI e Maria Antonieta. Há uma corte milionária que esbanja dinheiro em detrimento da maioria da população mergulhada na miséria, na dor, no sofrimento, no distanciamento total dos meios de consumo. O sistema através da propaganda incita a usar, a comprar, porém, a classe trabalhadora não tem como manter suas necessidades mínimas de sobrevivência. A falha da educação, não preparando um cidadão para o conhecimento, para as normas, valores, juntamente com um sistema colonialista e capitalista selvagem, possibilita que um tênis e um celular valham mais que uma vida humana.
Prezado Rui, você sabe por onde anda Marechal Deodoro da Fonseca, Floriano Peixoto e Benjamin Constant Botelho de Magalhães? Se souber, diga para eles que precisamos de reinventar a nossa república brasileira.
Um abraço do
Prof.José Luiz Teixeira do Amaral

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